A multa por infração ao controle administrativo das importações, no percentual de 30% sobre o valor aduaneiro das mercadorias, está prevista no artigo 169, inciso I, alínea “b”, do Decreto-lei nº 37, de 1966. Esta penalidade é tipificada pela importação de mercadorias sem licença de importação condicionada a prévio exame e anuência de órgãos estatais, tais como Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio etc.

Por primeiro, cabe frisar que se trata de penalidade ultrapassada e totalmente desproporcional nos dias atuais, já que os contribuintes são onerados em 30% do valor das mercadorias por eles importadas. Mas, enquanto ela permanece em nosso ordenamento jurídico, uma alternativa seria a aplicação do princípio da retroatividade benigna aos casos em que atualmente a licença de importação não mais é exigida, mitigando, assim, seus efeitos nocivos para as operações de comércio exterior.

É importante notar que a penalidade referente à falta de licença de importação não possui caráter tributário, tratando-se, em verdade, de multa de natureza administrativa, que poderia ser definida como sanção pecuniária imposta ao particular em virtude do descumprimento voluntário de uma norma administrativa, decorrente do exercício do poder de polícia do Estado. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), inclusive, possui várias decisões nesse sentido (REsp 623.023/RJ, RESP 714.756/SP e RESP 429.868/SC).

Trata-se de penalidade ultrapassada e totalmente desproporcional nos dias atuais

Assim, tendo em vista o acima, quer nos parecer que seria inaplicável para tal penalidade as regras previstas no Código Tributário Nacional (CTN).

Estando superada a discussão a respeito da não aplicabilidade das disposições do CTN, passamos em seguida à análise da questão da retroatividade benigna, no que se refere à multa aplicada em razão da ausência de licença de importação.

É bem verdade que, quando a Constituição Federal de 1988 (CF) disciplinou a retroatividade benigna, levou em conta somente a esfera penal, conforme se infere da redação do artigo 5º, XL – “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.

Mesmo assim, entendemos que, em se tratando de sanção de caráter administrativo, afigura-se cabível a analogia, concedendo-se efeito retroativo às novas regras, quando mais benéficas ao sujeito atingido pela penalidade. Esse entendimento encontra respaldo em precedentes do Poder Judiciário (Apelação Cível nº 2002.70.03.0057205/PR, TRF-4; Apelação Cível nº 1.0024.06.1969648/ 001(1), TJ-MG; Acórdão nº 440, TER-RO, Rel. Élcio Arruda; e Agravo nº 1.0024.07.4490731/ 001(1), TJ-MG).

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) também referendou este entendimento por meio do acórdão 3202-000.398, com a ementa: Falta de licenciamento não automático. Multa por falta de licenciamento automático. Não é cabível a aplicação da multa por falta de licenciamento automático (LI), porque atualmente este se encontra dispensado, devendo ser aplicada, com fulcro no princípio da retroatividade benigna, a norma mais benéfica ao contribuinte, a qual não mais exige licença de importação condicionada a prévio exame e anuência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Por fim, lembramos que os tribunais superiores (REsp 1.222.263/PR e AgRg no Ag 570.621/RS) e o próprio Ato Declaratório Normativo Cosit nº 12, de 1997, também mitigaram a aplicação da penalidade em questão ao dispor que não constitui infração administrativa ao controle das importações a declaração de importação da mercadoria objeto de licenciamento no Siscomex, cuja classificação tarifária errônea ou indicação indevida de destaque “ex” exija novo licenciamento, automático ou não, desde que o produto esteja corretamente descrito, com todos os elementos necessários à sua identificação e ao enquadramento tarifário pleiteado, e que não se constate, em qualquer dos casos, intuito doloso ou má fé por parte do declarante.

Gilberto de Castro Moreira Junior é doutor em direito econômico e financeiro pela USP, conselheiro da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e sócio de Lautenschlager, Romeiro e Iwamizu Advogados

Por Gilberto de Castro Moreira Junior
Valor Econômico

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